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blog sobre Economia.

domingo, abril 23, 2006

Homens mais ricos da Rússia detêm um quarto do PIB do país

Oito anos depois da crise no mercado financeiro, a Rússia vai muito bem.

     Esta semana, a edição russa da revista Forbes revelou que os cem russos mais ricos possuem bens avaliados em 248 bilhões de dólares, ou mais de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
     Roman Abramovich, 39 anos, proprietário do time inglês Chelsea, continua a liderar o ranking com uma fortuna de 18,3 bilhões de dólares. Do ano passado para cá, ele enriqueceu 3,6 bilhões de dólares. No total, o patrimônio dos oligarcas da Rússia cresceu 107 bilhões de dólares em 2005.
     Segundo ranking publicado pelo jornal Sunday Times em 2004, Roman Abramovich é também o homem mais rico da Inglaterra, onde passou a residir a maior parte do tempo desde que comprou o Chelsea por 250 milhões de dólares, em julho de 2003. Logo de cara, o magnata desembolsou mais 200 milhões de dólares para montar um bom time - e conseguiu fazer do Chelsea uma equipe competitiva. Foi assim que a antes xenófoba torcida do clube inglês adquiriu o hábito de entoar em coro, durante os jogos, a canção folclórica russa "Kalinka", e depois gritar em uníssono: "Estamos cheios da grana!"

Roman, é claro, ri à toa

     O time de futebol é uma parcela bem pequena dos negócios de Abramovich. O russo é dono de empresas de petróleo, alumínio e automóveis. Foi um dos poucos oligarcas poupados pelo presidente Vladimir Putin em sua caça aos marajás, que já pegou gente grandissíssima como Mikhail Khordokovsky (foto ao lado), 42 anos, fundador da empresa petrolífera Yukos e número 1 da lista da Forbes de 2004. Atualmente ele cumpre pena de 8 anos de prisão em uma penitenciária da Sibéria, condenado por fraude e evasão fiscal. No ano passado, Khodorkovsky ainda chegou a aparecer no ranking da Forbes em 21o., com uma fortuna de 2,1 bilhões de dólares. Mas este ano ele está de fora do top 100 e a Yukos enfrenta a falência.


Represálias políticas

     Coincidência ou não, Khodorkovsky costumava ser o grande financiador da oposição a Putin. Outros magnatas fugiram do país depois de terem prisão decretada - dentre eles, Boris Berezovsky, que incomodou Putin devido ao controle que possuía sobre os principais meios de comunicação do país.
     A tática de sucesso de Roman Abramovich para escapar da caçada é simples: não contrariar o onipotente Putin. Enquanto isso, vai tratando de colocar a salvo seu patrimônio, investindo-o no exterior.
     Em 2003, Abramovich vendeu parte de suas empresas na Rússia e transferiu o dinheiro para a Inglaterra. Admitiu, para os jornalistas ingleses, que se preocupa com as incertezas políticas da Mãe Rússia e com a impossibilidade de gastar, em sua terra natal, o dinheiro da forma que bem entende. Na Inglaterra, pelo contrário, ele pôde finalmente desfrutar a vida de acordo com a sua condição de magnata: comprou um Boeing para uso particular, um iate de 128 milhões de dólares, um apartamento no mais luxuoso bairro londrino e uma propriedade no campo com um haras de 100 cavalos, onde passa os momentos de descanso com a esposa, Irina, e os cinco filhos.

Roman e Irina: London calling

     Filho de ucranianos, Abramovich ficou órfão aos 4 anos e foi criado por um tio. Começou a carreira aos 21 com uma fábrica que produzia bolas e patinhos de plástico. Mais tarde, passou a negociar com derivados de petróleo na então recém-aberta bolsa de valores russa. Foi por essa época que interrogaram nosso herói sobre o roubo de 55 vagões de trem repletos de petróleo. Os investigadores não conseguiram estabelecer uma ligação dele com o crime. Em 1995, Roman alcançou a glória: com a ajuda do oligarca Berezovsky, ficou amigo do presidente Boris Ieltsin e fez parte do seleto grupo de empresários que comprou por uma ninharia as principais estatais da ex-URSS.
     Mesmo depois de consolidar sua fortuna, Abramovich continua muito dinâmico. Tanto, que encontra tempo para exercer o cargo de governador da pobrinha província de Chukotka, nos confins da Sibéria. Lá vivem apenas 75 mil pessoas (em geral, criadores de renas) que o elegeram com 92% dos votos. O magnata tirou 200 milhões de dólares do próprio bolso para construir escolas e centros culturais para a população. Além disso, conseguiu facilidades fiscais para as empresas que se instalassem ali. É claro que o consórcio petrolífero do qual é acionista, o Sibneft, é um dos favorecidos pelas isenções de impostos.

Em Chukotka: bom de voto

     A maior parte da população russa (que possui uma média salarial de 3.600 dólares por ano, segundo dados do governo) odeia seus oligarcas justamente por essa maneira escusa como enriqueceram, durante o período caótico de privatizações que se seguiu ao fim da União Soviética. Por isso, Abramovich está preparando direitinho seu refúgio no Ocidente, caso a caça aos marajás se intensifique.


E o motivo todo mundo já conhece
(é que o de cima sobe e o de baixo desce)


     Os cem russos mais ricos são, em geral, bastante jovens. Com 34 anos de idade, os 3 integrantes mais jovens da lista são Danil Khachaturov, diretor executivo da Rosgosstrakh, e Andrei Melnichenko e Sergei Popov, co-proprietários da MDM. É que os jovens estavam mais preparados para o mundo capitalista do que os velhos apparatchik do Partido. Assim, souberam tirar proveito das oportunidades de negócios. Nos últimos anos, a onda de ofertas públicas de ações e as tentativas do governo de mostrar uma Rússia mais atraente a investidores estrangeiros contribuíram para enriquecer ainda mais a classe dos mega-ricos.
     Em comunicado à imprensa, Maxim Kashulinsky, editor da Forbes na Rússia, afirmou que "O fluxo de dinheiro para dentro do mercado de ações, o preço alto dos metais e a crescente atratividade das empresas bancárias, de seguro e de construção são os principais motivos para o aumento do patrimônio dos membros da lista".
     Essa é a segunda leva de magnatas da Rússia pós-comunismo. A primeira era formada por oligarcas ligados ao então presidente Ieltsin. Viviam na maior ostentação, até que veio a quebradeira geral de 1998, quando o país chegou a tal nível de desorganização, que algumas das funções do Estado, como arrecadação de impostos e pagamentos de salários, não estavam mais sendo realizadas. O déficit fiscal cresceu como nunca, e pra piorar, houve queda do preço do petróleo no mercado internacional. Em 17 de agosto daquele ano, o país declarou moratória no pagamento das suas dívidas interna e externa e desvalorizou o rublo. Tudo isso derrubou a já turbulenta bolsa de valores russa e os magnatas de Ieltsin acordaram 70% mais pobres.
     Agora, discrição é a palavra de ordem entre a atual geração de bilionários russos. Os solteiros mais cobiçados do país levam uma vida discreta, até para apaziguar a ressentida opinião pública. Enquanto isso, o mercado de ações de lá vai batendo vários recordes desde 1999, devido aos altos preços do petróleo, dos metais e do gás natural e à intensificação do consumo interno. A inflação está sob controle. Somados, esses fatores fizeram a economia do país expandir-se com altos índices pelo oitavo ano consecutivo.
     Mas a Rússia ainda apresenta alguns desequilíbrios. De acordo com economistas, empresas de pequeno e médio porte respondem por uma parcela muito menor da atividade econômica do que em outros países em desenvolvimento. É que, apesar de muito dinâmico, o capitalismo russo ainda não está bem desenvolvido, e uma evidência disso é a grande concentração de riqueza nas mãos dos tais oligarcas.
     O PIB da Rússia, segundo previsões do governo, deve aumentar para 939,9 bilhões de dólares neste ano.

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Quer saber mais sobre os bilionários russos? Levar a vida como um bilionário russo, ou quem sabe casar com um deles? Clique nesses links da Forbes:

* Live like a Russian billionaire
* The golden hundred - 2004
* The 100 richest Russians - 2004

quinta-feira, abril 13, 2006

Um antigo debate sobre política monetária

O texto abaixo foi extraído de Introdução à economia, de Gregory Mankiw (São Paulo, Pioneira Thomson Learning, 2005).

O mágico de Oz e o debate da prata livre

     Quando criança, você provavelmente assistiu ao filme O mágico de Oz, baseado em um livro infantil escrito em 1900. O livro e o filme contam a história de uma menina, Dorothy, que se vê perdida em uma terra estranha e distante de casa. O que você provavelmente não sabe é que a história é uma alegoria sobre a política monetária dos Estados Unidos no fim do século XIX.
     De 1880 a 1896, o nível de preços na economia dos Estados Unidos caiu 23%. Como esse foi um fato inesperado, levou a uma grande redistribuição de riqueza. A maioria dos agricultores do Oeste do país estava endividada. Seus credores eram os banqueiros do Leste. Quando o nível de preços caiu, o valor real dessas dívidas aumentou, enriquecendo os bancos à custa dos agricultores.
     De acordo com o políticos populistas da época, a solução para os problemas dos agricultores estaria na livre cunhagem da prata. Durante esse período, os Estados Unidos operavam com o padrão ouro. A quantidade de ouro determinava a oferta de moeda e, como conseqüência, o nível de preços. Os que defendiam a prata livre queriam que tanto a prata quanto o ouro fossem usados como moeda. Se adotada, essa proposta teria aumentado a oferta de moeda, elevando o nível de preços e reduzindo o encargo real das dívidas dos agricultores.
     O debate a respeito da prata foi acalorado e representou um aspecto central da política da década de 1890. Um slogan eleitoral comum dos populistas era "Estamos hipotecados. Tudo, menos nossos votos". Um proeminente defensor da prata livre foi William Jennings Bryan, o candidato democrata à presidência em 1896. Ele é lembrado, em parte, por causa de um discurso na convenção de nomeação do Partido Democrata, em que disse: "Vocês não devem pressionar a fronte do trabalhador com esta coroa de espinhos. Vocês não devem crucificar a humanidade em uma cruz de ouro". Raramente, desde então, os políticos trataram tão poeticamente as alternativas de política monetária. Ainda assim, Bryan perdeu a eleição para o republicano William McKinley e os Estados Unidos mantiveram o padrão ouro.
     L. Frank Baum, ator do livro O mágico de Oz, era um jornalista do Meio-Oeste americano. Quando decidiu escrever uma história para crianças, ele fez os personagens representarem os protagonistas da maior batalha política da época. Embora os comentaristas modernos do livro divirjam um pouco sobre a interpretação dada a cada personagem, não restam dúvidas do fato de que a história destaca o debate sobre política monetária. Eis como o historiador econômico Hugh Rockoff interpreta a história, na edição de agosto de 1990 do Journal of Political Economy:

DOROTHY: Tradicionais valores americanos
TOTÓ: Partido proibicionista, também conhecido como partido que prega a abstinência do álcool
ESPANTALHO: Fazendeiros
HOMEM DE LATA: Trabalhadores da indústria
LEÃO COVARDE: William Jennings
Bryan
MUNCHKINS: Cidadãos do Leste
BRUXA MALVADA DO LESTE: Grover Cleveland
BRUXA MALVADA DO OESTE: William McKinley
MÁGICO: Marcus Alonzo Hanna, presidente do Partido Republicano
OZ: Abreviatura de onça de ouro (medida de peso do ouro)
ESTRADA DE TIJOLOS AMARELOS: Padrão ouro


     No final da história de Baum, Dorothy consegue encontrar o caminho de casa, mas não só seguindo a estrada de tijolos amarelos. Após uma jornada longa e perigosa, Dorothy percebe que o Mágico é incapaz de ajudar a ela e a seus amigos. Em vez disso, a menina finalmente descobre o poder mágico de seus sapatinhos de prata (quando o livro foi transformado em filme, em 1939, os sapatinhos de Dorothy passaram de prata para rubi. Os cineastas de Hollywood estavam mais interessados em exibir a nova tecnologia do Technicolor do que em contar uma história sobre a política monetária do século XIX).

     Embora os populistas tenham perdido o debate sobre a livre cunhagem de prata, eles finalmente obtiveram a expansão monetária e a inflação que desejavam. Em 1898, exploradores descobriram ouro próximo ao rio Klondike, no Yukon canadense. O aumento da oferta de ouro veio também das minas da África do Sul. Como resultado, a oferta de moeda e o nível de preços começaram a aumentar nos Estados Unidos e em outros países que operavam sob o padrão ouro. Em 15 anos, os preços nos Estados Unidos voltaram aos níveis da década de 1880, e os agricultores se encontraram em melhor posição para lidar com suas dívidas.

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Links sobre o assunto:

* Teach with movies - The wizard of Oz
* "The wizard of Oz as a monetary allegory" by Robert F. Mulligan, Ph.D., Western Carolina University College of Business

sexta-feira, abril 07, 2006

Turbulences - 24 heures dans le marché global


Para filmar este documentário em 1997, a diretora canadense Carole Poliquin (foto) viajou pelo mundo: Paris, Québec, Ontário, Chiapas, Senegal.

Na Tailândia, enquanto o secretário do Comitê de Investimentos do país afirma que o welfare-state é um problema (pois se o povo ganha bem demais e se "seu povo vive muito confortavelmente, então seus produtos não são competitivos"), as sobreviventes do incêndio que matou 188 trabalhadoras em uma fábrica de brinquedos fazem um misto de cerimônia e manifestação em memória das colegas falecidas. Tumthong, uma dessas sobreviventes, relata: "Os empregadores nos dizem: se vocês reivindicarem demais, nós nos mudaremos para Laos. E se eles forem mesmo - porque lá os salários são mais baixos - então nós perderemos nossos empregos."

A realizadora sabe mesclar esses e outros depoimentos com habilidade, evitando as armadilhas da demagogia. O resultado é um vídeo de 53 minutos, tão acessível quanto contundente ao refletir acerca do poder dos mercados financeiros sobre a vida das pessoas comuns, nesta época em que a hegemonia da lógica e da esfera financeiras na atividade econômica chegou também ao próprio debate econômico. Basta observar que, na maioria das vezes, o noticiário econômico só começa a falar em crise a partir do momento em que indicadores da movimentação e da valorização dos ativos financeiros sofrem alguma deterioração. Ou seja, é como se, mesmo com os trabalhadores em condições precárias, com o enorme contingente de desempregados etc., a citada Tailândia (ou o Brasil), por ser um mercado emergente, de produtos competitivos, fosse então o melhor dos mundos.

Especialistas em mercado financeiro como Pablo A. Riverroll, do México, marcam presença no documentário definindo o que atualmente se considera investimento de longo prazo: 1 mês. A fala do economista italiano Ricardo Petrella é ainda mais reveladora. Segundo ele, a economia mundial "está dominada por uma ordem do dia que enxerga apenas o hoje, o curto prazo. O longo prazo não existe na economia de mercado. Mas uma sociedade sem cultura de longo prazo não é uma sociedade. Uma sociedade que não prevê o que fará com seus idosos, ou o que será de seus rios dentro de 30 anos? Uma sociedade sem cultura de longo prazo é a selva".
Então esse poder sem precedentes dos mercados financeiros constitui uma ameaça à democracia? Petrella afirma: "Hoje em dia, quem fixa a ordem do dia, onde investir, como e qual é a política pública em termos de infra-estrutura, de investimentos, de educação? São os mercados financeiros. Porque de agora em diante não haverá mais países, nem sociedade. Como disse Thatcher: 'There's no such a thing as a society', há apenas mercados."

Com seu estilo claro, direto e conciso, o filme de Carole Poliquin é, como bem definiu a crítica do L'aut' journal, "uma dose cavalar contra nossa incompreensão do mundo atual".


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Links:

* Assista a trecho do documentário.
* Veja galeria de fotos.
* Adquira o filme.



Leia trecho da fala do economista Jim Standford em Turbulences:
"A crise do peso é um exemplo interessante do que acontece quando a economia do papel sai de controle. O presidente do FMI afirmou que era a primeira crise monetária do século XXI e tem razão, e veremos outras. No caso do México, o governo fez tudo certo, tudo o que os mercados financeiros queriam: reduziram o déficit, reduziram os programas sociais, os gastos, privatizaram, e até firmaram o tratado de livre comércio, o Nafta. Fizeram o essencial para os mercados financeiros, e o que aconteceu? O México conheceu um grande influxo de capitais. Porque os investidores amaram o que estava acontecendo. Mas esse dinheiro não foi parar na economia real. Foi parar na especulação sobre os mercados financeiros mexicanos. Como resultado, bastou um rumor sobre desvalorização no México e bilhões de dólares deixaram o país subitamente, e a economia mexicana ficou devastada.
Os mercados financeiros adquiriram vida própria, eles criaram uma economia própria, uma economia de papel que cobre a economia real. Pois eles descobriram que é possível fazer muito dinheiro apenas comprando e vendendo papel, incomparavelmente mais dinheiro do que se pode ganhar através de investimentos reais."